terça-feira, 6 de março de 2012

Périplo 2011, Eslovénia - Dia 9: os Stones em Piran

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Deitámo-nos sem saber se ficaríamos na Ístria Eslovena mais um dia. Não por falta de vontade, mas porque a noite não estava a correr bem: a malta jovem que nos rodeava não se calava em conversas animadas por cerveja a rodos e outros líquidos potentes. As melgas também tinham feito das suas durante o jantar, pelo que o ânimo não era grande. Mas tudo correu bem: a noite acabou por ser bem dormida e as melgas, apropriadamente, foram chatear outros (no nosso quartinho também não entravam, não!).
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Acordámos bem dispostos e com pica para visitar Piran durante a manhã e mergulhar na praia de Izola durante a tarde. Em Piran tivemos que aparcar fora da cidade e caminhar cerca de um quilómetro, empurrados por um ventinho que prometia refrescar o dia. O porto de Piran mostrava-se tão acolhedor como o de Izola - o oposto absoluto da opulência avassaladora e inquietante dos portos de Cannes e do Mónaco.
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Continuámos o passeio relaxado por entre as ruas de Piran, subindo lentamente até às muralhas da cidade, que se avistavam à distância. Como em Izola, a maioria dos turistas pareciam eslovenos e italianos, desfrutando da paisagem belíssima sem pressas. A vista das muralhas era extraordinária: do outro lado do Golfo de Trieste, no prolongamento da península, o que julgámos pudesse ser Veneza (mas não deveria ser); à direita, para norte, no prolongamento de Trieste, os Alpes, encimados por neve; e, aos nossos pés, o rendilhado em tijolo dos telhados de Piran.
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Descemos novamente até à Praça Tartini (Tarinijev tgr em esloveno; Piazza Tartini em italiano - as duas línguas oficiais do município), do compositor italiano Giuseppe Tartini. Parecia que os habitantes locais só agora estavam a acordar: as esplanadas ganhavam movimento e os pequenos negócios montavam escaparates ou abriam portas. Ao chegarmos à praça fomos atraídos pela música que saía do bar Zizola (nome de um fruto do tamanho de uma azeitona pequena, que infelizmente não vimos à venda para provar) e pela respectiva esplanada de sofás, tão convidativa com vista sobre toda a praça: nem tarde nem cedo para um café merecido. Perguntei ao funcionário de serviço qual a música que estavam a passar e fui parcialmente surpreendido: um tema dos Rolling Stones de que não me lembrava, com um ritmo mais lento, algo mais sonhador, no género de Waiting on a friend ou de Time waits for no one. Foi o café perfeito no local mais acolhedor do mundo, àquela hora, naquele dia, a fazer-nos lembrar que o tempo não espera mesmo por ninguém - e que ou deixamos que ele passe por nós ou somos nós a fazermos por passar por ele. Nisto não temos dúvidas, por isso fizemos por desfrutar daquele momento sublime.
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Retomámos o passeio em direcção à Catedral de S. Jorge, com origem no séc. XII. Optámos por visitar apenas a sua torre, de onde pudemos registar mais alguns instantâneos excelentes. A fotografia do menino a conversar com o seu cão, no prolongamneto em diagonal do sino da igreja, é uma das minhas favoritas de toda a viagem.
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Contornada toda a península ao ritmo de quem está bem com a vida e já de regresso, encontrámos algumas metralhadoras enferrujadas em várias ruas, talvez a lembrar a passagem de Piran para soberania italiana após a 1ª Grande Guerra e para soberania jugoslava após a 2ª: a história não se deve esquecer para que o futuro possa ser maior... Enfim: três horas de estacionamento levaram-nos seis euros redondos, mas se valeu a pena! Poupámos no almoço, que consistiu de sandes de carne estufada da noite anterior, um sumo de pacote esloveno e um olhar extasiado sobre os Alpes distantes.
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Voltámos a Izola para o banho prometido nas águas do Adriático. Não fossem os pedregulhos e pedrinhas cortantes, que impossibilitavam o caminhar, mesmo cuidado, teria sido a banhoca perfeita. Os banhistas locais estavam preparados e traziam uma espécie de sandálias para andar na água; de outro modo, não se podia: não cortei a planta dos pés por sorte! Nesta água, sim, foi-me fácil boiar - talvez por ser mais salgada. Não demos o tempo por mal gasto. Na verdade, a temperatura da água convidava a um banho de horas, mas eu já a tinha fisgada: um lanche de petingas no mesmo bar do dia anterior! E que lanche! Para além das petingas, o mesmo funcionário teve a cortesia de nos trazer, só para provarmos, uma bolinha de bakalla divinal (o nosso bacalhau salgado mas servido com a consistência da pasta de atum). Conversa puxa conversa e soubemos que havia estado em Coimbra há pouco tempo, em casa de um amigo que ali estava a estudar. Achou que Portugal e a Eslovénia são muito parecidos. Bem, pela amostra, à mesa, sem dúvida!
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No regresso ao parque de campismo ainda parámos em Strunjan, perto de onde roubei esta foto à pernaça da Lili, ostentando as provas inequívocas de umas férias vividas intensamente!
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Nota do dia: quem ainda pensa que viver nas grandes cidades é sinónimo de qualidade de vida deve padecer de uma qualquer doença civilizacional. A pequeníssima faixa costeira eslovena é uma prova real de que o litoral não necessita de ser selvaticamente urbanizado para perseguir essa qualidade de vida utópica e aparente.
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Conta-quilómetros: 2905 (40 nesta etapa)
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