segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Adega do Caneco, Santarém

Aqui bem se come

 
 
Há coisas assim: estava tudo planeado para jantarmos num dos dois restaurantes da moda de Santarém, por indicação do pessoal simpático do N1 Hostel Apartments and Suites, e acabámos numa outra casa de bem servir, mais modesta, a 50 metros dos primeiros, com casa já cheia ou mesas todas reservadas, numa sexta-feira à noite.
 
A Adega do Caneco é uma casa simples e com uma decoração cheia de bom gosto: fotografias e cartazes do mundo da tauromaquia (não gostamos das lides, que fique claro, mas temos o distanciamento suficiente para perceber a paixão patente naquelas paredes).
 
  
O proprietário da Adega do Caneco, o Sr. José Leiria, assim conhecido na capital ribatejana, recebeu-nos com umas azeitonas deliciosas e pão de centeio do dia. E não perdeu tempo com ementas e ambições de lucros desmedidos: "os pratos do dia são bacalhau espiritual e medalhão de lombo de porco com batatas à murro". Hesitámos, depois de perguntar como era o bacalhau espiritual (que já comêramos algures, mas sem memórias precisas). "Por que não mandam vir os dois; trago um primeiro, partilham, e depois trago o outro." Bem dito, bem feito: gostamos de gente que vai direta ao assunto com uma solução capaz.

E a nossa Inesinha, de quase 14 meses, que entrou no restaurante a meio de um soninho tardio, acordou a tempo de devorar o dito espiritual. Comeu mais do que a mãe! Não admira, pois estava profundamente delicioso - equilibradíssimo de sabores e suave (sem lascas de bacalhau mais seco).

O medalhão de lombo de porco (preto) foi assado na hora e as batatas pareciam ter sido feitas há pouco, também, o que não era de esperar de um prato do dia. Tudo muito bom e tudo muito bem, que é que se diz do produto e do processo. O lombo poderia ter levado um pouco mais de pimenta preta para satisfazer plenamente o meu gosto, mas só de referir esse pequeno pormenor já estou a ser ingrato.

Foi tudo regadinho com um fino de entrada (que o Sr. José Leiria quis confirmar, depois de decidirmos tudo o que queríamos: "para começar uma imperial, então, não é?") e uma canequinha de 250ml de vinho da casa (de Alpiarça), de suavidade e singeleza equiparáveis ao manjar.

Acabei com um descafeinado e pedi a conta (não tínhamos perguntado por preços): tudo, mas tudo mesmo: simpatia, simplicidade, ambiente confortável, comes e bebes a gosto, por uns enormes dezasseis euros!

Deixámos 20 euros e agradecemos a honestidade do serviço. É possível ganhar a vida assim!

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Vidigueira, Antão Vaz

Enólogo dos Tesos


Há uns anos atrás, aproveitávamos o período da Páscoa ou Carnaval para um passeio pelo Alentejo, sempre verdejante por aquelas alturas. No regresso, trazíamos a bagageira do Toyota Yaris atestada de vinhos da região. Redondo, Borba e Vidigueira foram as adegas cooperativas que mais visitámos, mas foi sempre da última que vínhamos mais satisfeitos, tanto pela qualidade dos vinhos (brancos) como pelo preço simpático. Mas havia algo que não estava bem com aquelas garrafas: a cara não batia com a careta, como sói dizer-se. Os rótulos não mostravam o bom gosto, elegância e despretenciosismo daqueles vinhos.
 
Há dias, numa promoção do Pingo Doce, comprei uma caixa do Vidigueira, Antão Vaz (Ato IV, A Inspiração) apenas e só porque gostei do seu rótulo: uma imagem sóbria e elegante. Limpa. Porque, quanto ao vinho, tinha quase a certeza de não vir a ser defraudado.
 
Dito e feito: casou, hoje, maravilhosamente com umas cavalas grelhadas (temperadas à moda da minha mãe: com alho, pimenta, sal, limão e um pingo de azeite), batata cozida, feijão verde e pimento assado (estes dois últimos da horta da abençoada avó Inês).
 
No rótulo da garrafa lê-se que é um vinho com aroma a frutos tropicais. Não lhes senti o rasto. Mas será por defeito do meu nariz, que - humilde confissão deste enólogo amador -, não é flor que se cheire. Foi só maçã e flores à sombra. E, na boca, um final muuuuuito longo, mineral. E sal.
 
E a cavala quis sal, como bem se percebe.
 
Nota final: para não parecer que falta algo a este curto ensaio, resta dizer que não temos regressado ao Alentejo porque já o palmilhámos e saboreámos quase todo. E porque há tanto mundo belo para conhecer... Quase todo, disse: não conhecemos Barrancos. Hmm...

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Croácia (Périplo 2012), dia 14: Arles e o fim da viagem

Já tínhamos passado em Arles em duas ou três ocasiões, mas sem parar. Sabíamos que justificava uma visita, pois alguns dos seus monumentos são património da humanidade da UNESCO. Ora, tendo aqui pernoitado um pouco por acaso, por que não aproveitar a ocasião?
 
Por isso levantámo-nos cedo. Tentaríamos visitar o essencial durante a manhã. Ainda tínhamos dois dias para chegar a casa, por isso podíamos gerir o tempo com alguma folga.
 
Comprámos um bilhete conjunto para o anfiteatro e o teatro romanos. Começámos pelo anfiteatro, que estava muito bem preservado (na verdade, é um dos mais bem preservados do mundo). Tem capacidade para 21000 pessoas e ainda hoje é usado, em especial para a realização de touradas, de que vimos alguns cartazes. Das bancadas do topo vê-se toda a cidade. Dali, aproveitei para fotografar algumas portadas das casas em redor.
 






O teatro está mais degradado, mas não descuidado. As duas colunas que ainda sobrevivem de pé chamam-se "As duas viúvas". É aqui que se realiza o festival de Arles todos os anos.




Terminámos a visita à cidade com um passeio pelas ruas centrais de Arles até à Praça da República, onde pudemos apreciar a fantástica fachada românica da Église St-Trophime.



Levantámos a hipótese de acamparmos em Segóvia - outra das cidades que temos adiado visitar. Mas o cansaço acumulado fez-nos decidir por um "tiro" até casa. E assim fizemos, deixando Segóvia para outra aventura. Chegámos a casa às 3 da madrugada do dia seguinte. Durante as últimas centenas de quilómetros deste nosso périplo à Croácia fizemos o balanço habitual, que em baixo sintetizamos.
 
Conta-quilómetros: 7064 (1398 no dia)
 
Despesa total: 2800 euros (inclui alimentação, alojamento, gasolina, portagens, visitas e lembranças adquiridas durante os 14 dias da viagem e antes da partida)
 
Aspetos negativos da viagem:

RUI

1º lugar: ter de deitar fora alguma comida
2º lugar: impaciência/ indiferença dos croatas
3º lugar: dificuldade em encontrar gelo

LILIANA

1º lugar: impaciência/ indiferença dos croatas
2º lugar: pouco tempo para desfrutar das coisas
3º lugar: quilómetros percorridos

Os melhores lugares:

RUI

1º Parque Nacional de Plitvice
2º Lago Garda
3º Peníncula de Peljesac
4º Dubrovnik
5º Zadar

LILIANA

1º Parque Nacional de Plitvice
2º Lago Garda
3º Dubrovnik
4º Ilha de Krk
5º Passagem pela Eslovénia


Os melhores momentos:

RUI

1º Adormecer ao relento sob o céu estrelado no Lago Garda
2º Nadar em Primošten ao pôr do sol
3º Jantar no molhe de San Sebastian ao pôr do sol
4º Oferecer melão português à vendedora de estrada perto de Ploče e receber em troca aquele sorriso
5º Tomar um copo de vinho branco Žlahtina em Vrbnik

LILIANA

1º Adormecer ao relento sob o céu estrelado no Lago Garda
2º Dar de comer aos peixes e patos em Plitvice
3º Tomar um copo de vinho branco Žlahtina em Vrbnik
4º Tomar banho em Orebić
5º Comprar fruta no mercado de Zadar


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Croácia (Périplo 2012), dia 13:


O 13º dia da nossa viagem ficou marcado por uma descida de temperatura acentuada e pela primeira chuva do périplo, quando descíamos em direção a Génova. Antes de percorrermos o norte de Itália, atravessámos a Eslovénia em duas horas e meia (com mais uma pequena paragem num supermercado - teríamos de inventar algum espaço para uma dúzia de garrafas de Union e Laško, as duas loiras eslovenas que já conhecíamos e apreciamos), saindo da Croácia a leste de Zagreb, numa zona rural. Tão rural que no primeiro posto fronteiriço que encontrámos não nos deixaram passar! Explicaram-nos que era apenas para croatas e eslovenos e que teríamos de andar alguns quilómetros para passarmos num posto mais internacional... Gostámos de rever a paisagem eslovena, mais organizada que a croata. Pena não podermos ficar um dia por ali...
 
Ao entrarmos em França decidimos que não acamparíamos nessa noite (também já era um pouco tarde) e que faríamos mais duas ou três centenas de quilómetros. Bastou um telefonema para o Ibis de Arles, onde chegámos perto da uma da madrugada. Cansados, após mil duzentos e quatro quilómetros.
 
Conta-quilómetros: 5666 (1204 no dia)
 
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domingo, 10 de agosto de 2014

Croácia (Périplo 2012), dia 12: Zagreb, cidade jovem

Para uma melhor visualização, clicar sobre qualquer uma das fotografias
 

Levantámo-nos muito cedo depois de uma noite muito bem dormida. O pequeno-almoço no hotel foi excelente, com exceção do sumo de laranja: pão, café, queijo, ovos com bacon e salsicha para sustentar o esforço do dia muito longo que aí vinha. A Lili não alinhou na parte britânica do repasto, já se esperava.
 
Saímos para Zagreb ainda a manhã despontava, quase sem trânsito nas estradas regionais em torno de Terme Tuhelj. A autoestrada para Zagreb parecia entrar pela cidade adentro, numa espécie de avenida ampla. E a primeira impressão foi muito agradável: organizada, dinâmica e com um ar limpo.
 
Demorámos algum tempo a encontrar um parque de estacionamento o mais central possível, mas lá conseguimos. Ficámos quase nas traseiras da Catedral da Assunção da Virgem Maria. Caminhámos pelas ruas em volta e constatámos uma arquitetura urbanística diferente da que tínhamos visto até agora, mais centro-europeia. Daqui passámos ao Mercado de Dolac, logo ao lado, e foi ver a Lili nas suas sete quintas...
 
 

 

Continuámos pela rua Tkalčićeva, construída ao longo do curso do ribeiro Medvešćak, que no passado dividia a zona de Kaptol, controlada pela igreja, da secular Gradec. Uma rua cheia de charme e cor, onde aproveitámos para fazer a primeira paragem do dia e tomar um ansiado café. De seguida dirigimo-nos para a fantástica Praça Markov, em Gradec, rodeada de vários edifícios governamentais e em que sobressai o telhado em mosaico da igreja de S. Marcos.





Um pouco abaixo da Praça Markov encontra-se a Torre Lotršćak, do século XIII, afamada pelo seu canhão, que é disparado todos os dias ao meio-dia em ponto. Chegámos lá 10 minutos antes, pelo  que esperámos pelo disparo antes de a visitar. Mais ou menos dois minutos antes do disparo (pelo meu relógio), entre um amontoado de turistas e viajantes, ergui os braços com a câmara preparada para uma fotografia fulgurante. O meu relógio não devia estar bem certo, pois ao fim de alguns minutos estava tão cansado que acabei por baixá-los para renovar a circulação sanguínea. Grande pontaria! Nesse preciso momento o canhão ecoou! Mas ainda fui a tempo de registar parte da fumaça provocada!
 
A subida à torre valeu pela vista geral sobre Zagreb. E por ver a Lili com vertigens, colada à parede da torre na plataforma de observação. Após a descida, logo ali, no Passeio Strossmayer, tirámos uma fotografia com o poeta Antun Gustav Matoš, um croata rebelde e sonhador e que celebrava a vida boémia de Zagreb nos seus escritos.



 

Descemos à Praça Ban Jelačić, o centro comercial de Zagreb, através do Portão de Pedra, onde se encontra uma capela em honra de Maria, mãe de Jesus. Fizemos uma oração nuns bancos em madeira, encostados a um canto sombrio do túnel, ao lado de uma senhora que, acabada a oração da Lili e a dela, nos pediu uma moeda! Devia passar ali o dia todo a ganhar a vida com os crentes!
 
Caminhámos pelos quarteirões em redor da Praça Ban Jelačić antes de almoçarmos num McDonald's apinhado, onde consegui dois pacotinhos de açúcar diferentes para a minha coleção e repetidos para trocas. É nesta zona comercial que se torna mais evidente o dinamismo da cidade, com uma população jovem, onde qualquer pessoa de mais idade se destaca. Acabámos a tomar um café em copo de plástico no parque Zrinjevac, rodeado de plátanos centenários e onde muitos jovens croatas e visitantes da cidade esticavam as pernas ou trocavam impressões. Passámos ali uma meia-hora sublime.
 



 

 
Tínhamos lido um apontamento sobre o cemitério de Mirogoj que nos deixou curiosos. Como ficava nos arredores da cidade na direção do santuário de Marija Bistrica, que planeáramos visitar no regresso a Terme Tuhelj, apontámos o Honda para nordeste, percorrendo as ruas até lá quase por intuição (o GPS não reconhecia nenhuma das ruas dos arredores do cemitério que tentávamos introduzir). E lá chegámos, ficando, de imediato, de boca aberta com a imponência da última morada de muitos croatas ilustres. As fotografias falam por si.
 
 




 
A caminho do santuário de Marija Bistrica parámos num pequeno supermercado para atestarmos a bagageira (o pouco que restava de espaço nela, na verdade) com cerveja, enchidos e queijo, para partilharmos com a família e amigos à chegada e nos meses seguintes. Foram 75 euros bem gastos, não duvidem! Infelizmente, não encontrei as duas melhores cervejas croatas que provei durante a nossa estada neste belo país: a Favorit e a Velebitsko. Ficarão na memória, o que já é bom. Aproveitámos a paragem para arrumar um pouco o carro (ao fim de mais de uma dezena de dias de viagem, por muito cuidado que tenhamos, as coisas parece que se vão desarrumando por si) e para deitar ao lixo dois bifes que tínhamos comprado no dia anterior para fazer ao jantar se tivéssemos acampado. Custou-nos fazê-lo, mas já não havia outra opção: a nossa arca refresca alguma coisita, mas não por tanto tempo.
 
Marija Bistrica, um santuário mariano, estava quase desértico àquela hora (ou naquela data). Embora fosse um templo belo, esperávamos que tivesse outra dimensão. Pudemos visitá-lo calmamente, o que foi muito agradável.
 
 




Chegámos a Therme Tuhelj ainda a tempo de aproveitarmos as águas termais das piscinas exteriores e interiores do hotel - as primeiras, frias mas agradáveis; as segundas, quentinhas - um deleite! Passámos a maior parte do tempo na área de jacuzzi, a preparar o corpo para os cerca de 2500 quilómetros que teríamos de percorrer no regresso a casa nos dois/ três dias seguintes.


Conta-quilómetros: 4462 (142 no dia)

Ler: Dia 0     Dia 13