quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Cabo Home, Península de Morrazo - Galiza

Andarilho
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Manhã muito cedo, pois o calor do meio-dia ameaçaria o prazer de caminhar, a clareza dos sentidos. Já aqui tínhamos vindo uma meia-dúzia de vezes, em piquenique ou para umas horas de sol na Playa de Melide, percorrendo de automóvel os caminhos de terra batida e esburacada pelas nortadas galegas - o que também tem o seu quê de aventura, em especial para as suspensões dos veículos.
Deixámos o bólide no parque de estacionamento improvisado junto ao bar que marca o ponto de partida para os 5,5 kms circulares do Cabo Home. Com tempo, muito tempo para apreciar uma das paisagens mais encantadoras da Península Ibérica, tirar fotografias, brincar com as nossas sombras, projectadas pelo sol nas escarpas, apanhar amoras... Há quanto tempo a Lili não apanhava amoras! Que bela sobremesa dariam!
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A beleza deste recanto da Península de Morrazo reside precisamente nas dificuldades de acesso. E nos horários tardios de nuestros hermanos. Já aqui estivemos várias vezes virtualmente sós até à hora de almoço, com uma praia belíssima e quase virgem só para nós e a família que explora o chiringuito ali estabelecido. O pinhal que bordeja a Playa de Melide, de face para as Islas Cíes, fornece-nos a sombra que aconchega o nosso descanso e faz saber ainda melhor o café que sai fumegante do termo preparado pouco depois do nascer do sol. É este o melhor café do mundo!
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Caminhámos até ao segundo farol do cabo, de onde se vê Vigo em toda a sua extensão e a majestosa ria homónima, pontilhada pelas bateas - viveiros de mexilhões - e entrecortada por praias apetecíveis. Algo mexe com os nossos estômagos; mas só pode ser sugestão. Os dois quilómetros finais acabarão por torná-la mais real e merecida. Tempo para um último olhar para o Atlântico, porta de muitas aventuras por escrever.
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sábado, 19 de junho de 2010

Por terras de Kölsch

Andarilho
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Em Colónia pedimos Kölsch quando a sede aperta. A palavra Bier, ou equivalente em todas as línguas de Babel, não serve. Ou melhor, serve apenas para que nos sirvam outra cerveja. O termo Kölsch é uma espécie de denominação de origem: descreve uma cerveja produzida unicamente em Colónia, leve, não carbonada, servida a uma temperatura apenas fresca, em copo fino. É deliciosa e bebe-se como água! Não admira que, à chegada, no aeroporto, lêssemos este anúncio luminoso: "Aviso de segurança: não deixe a sua Kölsch sem supervisão!" Genial!
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Decididamente, uma boa companhia para uns dias bem passados numa cidade jovem, cosmopolita, dinâmica e segura. A sua catedral e o Reno são os centros de encontro das gentes locais e de viandantes. Pressentimos um ritmo de vida pausado e responsável, mais próximo do de uma cidade escandinava. Aos 100 metros de altitude, de uma das agulhas da catedral, apreciámos essa harmonia de urbe que está bem consigo própria. Era quinta-feira, dia do Corpo de Deus; não esperávamos que, também ali, na Renânia-Vestfália, fosse feriado. O céu azul e as temperaturas de sul da Europa traziam as gentes à rua em celebração da vida: de bicicleta, pausadamente e em família; em piqueniques junto ao rio, bem regados a Gaffel, Sion, Früh, Zunft e Reissdorf Kölsch - as 5 magníficas que tive o prazer de (a)provar; a desfrutar do colorido das fachadas e da alegria das esplanadas...
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E foi na esplanada da cervejeira Sion que apreciámos o nosso primeiro almoço alemão desta viagem. Como aconteceu em ocasiões anteriores, a gastronomia germânica não nos desiludiu: os legumes e as saladas estão sempre presentes, como equilíbrio para o excesso de gordura dos seus pratos, cuja digestão a cerveja ajuda a acelerar. Despachámos uma Wurst de quase meio metro (na verdade, teria uns 30 centímetros, mas ao estômago pareceu ter mais) - incomparável a qualquer salsicha que possamos provar por terras lusas. E há sempre um elemento de surpresa nestas comezainas, pois o meu domínio razoável do alemão não me permite destrinçar claramente as especificidades dos pratos locais. A muita cerveja que se passeou fugazmente pela nossa mesa e o trato simpático das gentes fizeram-nos esquecer qualquer agrura causada por mal-entendidos linguísticos.
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O apelo do Reno torna obrigatória a realização de um cruzeiro pelas sua águas, seja de uma hora como o que fizemos, seja a cruzar as fronteiras dos países que atravessa. O tráfego de balsas de transporte e barcos de cruzeiro é intensíssimo, mas organizado, harmonioso. E como aquele olhar atento que dedicamos a um quadro de um pintor famoso que, consoante o ângulo em que o observamos, nos pode fazer senti-lo de um modo distinto, também a visão da cidade a partir do rio lhe acrescenta uma beleza ainda mais sóbria. Colónia cresceu com o rio e não apesar dele: a mancha urbana não se debruça sobre as suas águas, autoritária - respeita-as, não deixando por isso de ser dominadora, de o controlar.
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O fim da nossa estada só podia ser doce: o Museu do Chocolate - um dos mais visitados da Alemanha - é uma visita indispensável, mesmo para as pessoas de espírito mais amargo. Foi construído num pontão sobre o rio e aberto para ele. O carácter lúdico e interactivo que norteou a construção dos painéis explicativos e a disposição sequencial dos vários espaços tornam a visita leve e pouco maçadora (infelizmente, uma característica de muitos museus). Aconselhamos vivamente a passagem pela estufa tropical. Não tanto pelo leque de espécies vegetais que ali podemos observar, mas mais pela experiência de sentir na pele o abafamento provocado pela atmosfera húmida e quente ali recriada. Saímos dela um minuto depois e perguntámos a temperatura: o que pareciam 45 ou 50 graus eram apenas 28. A humidade pode ser avassaladora! Assim percebemos melhor a vida sofrida dos cultivadores de cacau, fielmente narrada e ilustrada no início do percurso. Deste modo, talvez possamos fazer do nosso mundo um mundo mais justo. A passagem pela loja do museu, no final, tornou certamente o meu mundo - e o de alguns familiares e amigos - um bocadinho mais doce.
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quinta-feira, 29 de abril de 2010

Restinga do Rio Cávado, Esposende

Andarilho
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Percorremos este circuito pedestre em Agosto do ano passado, numa manhã acabrunhada. Com o aproximar de fins de semana auspiciosos, prometemo-nos repetir o passeio, em busca de cores menos sombrias e brisas mais aconchegantes.
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A Restinga do Rio Cávado, no Parque Natural do Litoral Norte, a um olhar de Esposende, no prolongamento de Ofir, consiste de um cordão de praia arenosa e de dunas primárias e secundárias muito instáveis. Esta língua de areia entre o Atlântico e o rio Cávado merece o carinho de todos os amantes da natureza e da boa vida.
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Partimos de Ofir, junto às 3 torres que afamam o local, sob a sombra de um pinhal alto. As primeiras centenas de metros percorrem o caminho calcetado que serve as casas de verão de gentes endinheiradas. Não sabemos se invejá-los ou se lamentar o futuro que ameaça estas dunas belíssimas, que protegem os seus haveres sazonais. O bom do passeio começa onde a construção acaba, fruto do medo ou por força da lei: os passadiços em madeira conduzem-nos por uma paisagem deslumbrante, dominada pela água, ora à direita, com Esposende em fundo, ora à esquerda, onde o Atlântico se espraia. Do miradouro vislumbramos a foz do Cávado e a razão de ser da beleza deste local: a natureza a fazer-se e refazer-se pela força dos seus elementos; a energia infinita que anima o nosso planeta.
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Descemos à praia, por entre uma diversidade vegetal espantosa. Sentámo-nos a escutar os segredos do mar, a ouvir os seus queixumes. De um lado, dois quilómetros de praia deserta até à foz do Cávado. Do outro, dois quilómetros de praia deserta até Ofir. Apenas beleza, pontilhada por um ou outro detrito da humanidade. Nada que nos faça deixar de acreditar no poder absoluto da mãe natureza. E a ter alguma esperança. Mas talvez a questionar o nosso direito de estar ali.
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