quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

A Cerejeira

Árvores
Loa ao mais belo ser vivo à face da Terra.
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Nota introdutória:
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Sempre olhei para as árvores com reverência. A sua grandeza ultrapassa a dimensão estrita do reino vegetal. A árvore é, mais do que tudo, um ser sereno: vive bem consigo própria e com o mundo, ao qual tudo dá e pouco exige. Se Deus existe, tomou forma e vejo-o numa árvore.
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Esta rubrica faz parte de um projecto antigo, embora com forma sempre indefinida, de "catalogar" as árvores do mundo e as minhas memórias delas. Dou o pontapé de saída com a árvore de fruto que mais me fez sonhar (e trepar) durante a infância: uma amiga do coração - a Cerejeira.
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O seu bilhete de identidade: A Prunums avium pertence à família das Rosáceas, sub-família Prunoideas e género Prunus . É uma espécie rústica e de crescimento rápido. O tronco é direito e de casca lisa; a copa é ampla e formada por ramos divergentes; as suas folhas são simples e caducas; as flores formam longos colares pendentes e são geralmente brancas, embora haja espécies com flores em tons rosa, côr de pêssego...; e os frutos... ai os frutos!... são pequenos, globosos, carnosos e deliciosamente suculentos! Encontra-se um pouco por todo o mundo.

Conheci-a por volta dos meus oito anos, quando, vinda de Barqueiros, Barcelos, a minha família assentou arraiais no concelho de Lamego. A primeira Cerejeira que a minha memória se lembra de ter contemplado fazia sombra sobre a rampa de acesso à garagem onde, por volta de 1979, o meu pai se tinha estabelecido como electricista, na aldeia de Rossas, freguesia de Ferreirim. Muitas dores de barriga me causou a bem-dita! Depois da escola, que aí frequentava (a partir da 3ª classe), o pé e os ramos da magnífica árvore eram o palco das nossas brincadeiras fantásticas; não estranhando, portanto, que a coitadinha sofresse devastadores ataques aos seus frutos muito antes de estes estarem devidamente aptos para consumo, mal apresentassem alguns laivos de cor. Recordo-me com muita saudade da cor verde clareado das suas folhas sob a luz intensa da Primavera, que associo à inocência livre da minha infância.
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Mais recentemente, sempre que passo por terras durienses de visita à minha mãe, tenho como ritual comprar - caríssimas - as primeiras cerejas que aquelas encostas belíssimas e duras nos dão, e que se vendem ao longo da N101 entre o Alto de Cavalinho e a Régua. Deliciosas! A Liliana, a minha esposa, confessa contrair-se-lhe o coração sempre que vê uma Cerejeira de ramadas cheias, o que, tendo em conta o número extraordinário de exemplares por que passamos até Tarouca, lhe aumenta vertiginosamente a pulsação e a gula!
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Muitos ainda não terão tido o privilégio de ver um cerejal em flor. É uma visão confrangedoramente bela - a fragilidade da flor é tal (só duram uma a duas semanas, se não houver muito vento), que parecem algodão sobre as árvores. Para quem queira desfrutar da experiência e possa fazê-lo, há um trajecto lindíssimo e absolutamente inesquecível entre Lamego e Resende, via aldeia de Avões e S. Martinho de Mouros, pela encosta noroeste da Serra das Meadas, com vistas magníficas sobre o serpentear do Rio Douro. A foto que se segue foi tirada perto da lindíssima vila de S. Martinho de Mouros, há 2 anos atrás. Aqui encontrarão, na altura certa (que varia consoante as condições do clima), geralmente com os prenúncios da Primavera, um espectáculo inesquecível.
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Esta flor tão delicada e efémera é (apropriadamente, direi eu) o símbolo da felicidade no Japão; e a sua flor nacional. O chá de pétalas de Sakura (flor de Cerejeira) é utilizado durante os rituais de casamentos e nas ocasiões festivas. Para os antigos samurais, perder a vida em batalha num campo coberto de pétalas de cerejeira era a maior glória possível (não me recordo se na cena final de O Último Samurai o que vemos a cobrir o campo de batalha são pétalas de flor de Cerejeira, mas é provável que sejam). Esta simbologia delicada e lindíssima do país do sol nascente não terá paralelo em Portugal. Por cá, infelizmente, temos apenas os habituais festivais da cereja de Resende e do Fundão, regiões onde este fruto tem um potencial económico muito importante. Para além de algumas aplicações culinárias ou afins, como a mezinha para o afrontamento digestivo da avó da Liliana: cerejas estagiadas em aguardente!

Por isto tudo me confrange imenso ouvir falar da madeira de Cerejeira e da sua excepcional qualidade como matéria prima da indústria florestal e madeireira, como se o produto se pudesse sobrepor à árvore. Como é um espécime de crescimento rápido e de tronco direito, já se vê que desperta cobiçosos interesses. Mesmo sabendo-o inevitável, custa-me sacrificar meio quilo de cerejas acabadas de colher pelo fresquinho da tarde por um móvel polido e brilhante.

Mesmo que esse meio quilo de cerejas me faça passar o resto do dia na casa de banho - pois poucas coisas há tão supinamente deliciosas. Viva a Cerejeira e a cereja!

2 comentários:

Anónimo disse...

Ola Rui, vc no seu Blog, comentou k era de Barqueiros, Barcelos(, ou esterei eu enganado)?

MANHENTE disse...

Olá, amigo:

A família da minha mãe é que é de Barqueiros, onde vivemos algum tempo após o regeresso de África.

Obrigado pela visita e volte sempre.